quinta-feira, 16 de março de 2017

Enciclopédia das Lendas Urbanas e dos Mitos e Lendas do Brasil: O Bebê-Diabo.

A uns dias eu postei algo sobre o Jornal Notícias Populares, principalmente suas notícias que ficaram conhecidas, é uma delas é sobre o Bebê Diabo. Como esse caso e bastante extenso é o seu caráter de Lenda Urbana, explicarei nesta enciclopédia sobre esse ser mitológico, nascidos nas crônicas jornalisticas deste Jornal.


No dia 11 de maio de 1975 o Notícias Populares estampou na capa a sinistra manchete "Nasceu o Diabo em São Paulo". a matéria reportava o nascimento do ser mais esquisito que a cidade de São Bernardo do Campo veria em toda sua história. Este nascimento foi devidamente noticiado (Unicamente) pelo Notícias Populares. Segundo sua matéria, esta bizarra criança nasceu repleta de pelos, com dois chifres, rabo e já falava no primeiro minuto de vida. Segundo esta mesma matéria, o parto foi algo incrível, repleto de medo, mistério, correria e pânico. Quando a senhora finalmente deu à luz, pode-se ver a bizarra criatura que havia chegado ao mundo. Seu temperamento era horrível, ele era incontrolável. Em outra das 27 matérias publicadas sobre o caso, o jornal narrava a grande fuga do bebê que reclamava das condições do hospital, da claridade e que fugiu pulando da janela do 3º andar. Antes de fugir, o filho do demo teria gritado: “Aqui não é meu lugar. Essa mulher não é minha mãe… vou embora, não pertenço a este mundo. Não sou daqui, vocês são pavorosos. Faltam acessórios a vocês.” Depois disso, cada matéria revelava um novo incidente que teria sido causado pelo mal em forma de criança.

Eram brigas entre casais, vizinhos, amigos, acidentes trágicos, atropelamentos em massa, tudo o que acontecia na cidade tinha sua culpa atribuída ao filho do capeta. A cidade entrou em clima de desespero, mulheres não andavam mais sozinhas, mantinham suas casas trancadas, crianças também não podiam mais brincar na rua, o medo era completo. Para conter a fúria do bebê, grupos religiosos começaram a se unir para captura-lo, porém tudo foi em vão, ninguém foi capaz de encontra-lo. Por que o bebê nasceu assim?  O Notícias Populares deu duas explicações. Primeiro, porque, convidada para uma procissão na Semana Santa, a mãe teria batido na barriga e afirmado: “Não vou enquanto esse diabo não nascer”. Segundo porque, de acordo com um suposto médico, ela teria criado “descargas magnéticas negativas” ao desabafar: “Por causa desse diabinho, não posso ir dançar”. Boatos diziam que o pai da criança seria um discreto fazendeiro de Marília (SP) que, segundo vizinhos, “não tirava o chapéu por nada nesse mundo. A crença popular dizia que este o homem o usava para esconder os próprios chifres. Certo dia, finalmente uma seita religiosa conseguiu capturar o bebê que seria levado para uma clínica particular da cidade, contam que a tal clínica particular se ofereceu para exibi-lo ao público curioso, porém para poder conhece-lo havia uma série de recomendações – Desde que o visitante fosse maior de 18 anos, usasse um crucifixo, não tivesse problemas cardíacos e se assinar um termo de responsabilidade para caso fosse possuído por algum demônio.

Depois disso, começaram a surgir boatos de que ele havia escapado novamente, as pessoas o viam andando pelos telhados e mandando todos para o inferno. Outra matéria do Notícias Populares narrava o dia em que, após um ritual de umbanda, a tal criatura havia sido vista amarrada dentro de uma Kombi de cabeça baixa e chorando desesperada. Este grupo o teria prendido para leva-lo até o Nordeste e dar fim a situação, então a penúltima manchete do jornal foi categórica: “Zé do Caixão vai caçar bebê-diabo no Nordeste”. Porém, no dia seguinte, saiu a última matéria sobre o assunto, encerrando a saga do filho do demônio. Seu título dizia: “Povo vê de novo bebê-diabo no Grande ABC.”

Nenhuma outra publicação de Renome noticiou a história. Melhor para o Notícias Populares, que viu a edição se esgotar rapidamente. Nas 2 mil bancas que vendiam o jornal em São Paulo, sobraram só oito exemplares. Apesar do sucesso, o editor-chefe, Ebrahim Ramadan, relutou em seguir com o caso, mas a direção mandou a redação continuar. Até 8 de junho, foram feitas 27 reportagens.

A reação do público foi de histeria – e acabava virando notícia também. A operária Maria Aparecida, por exemplo, foi para a maternidade, exigindo: “Que isso aconteceu, aconteceu. Então, por que não o mostram?” A doméstica Prudência Antônia Pereira garantiu ter visto a criança: “Quando não entendiam seus desejos, ele rosnava como cachorro. Depois, limpava as unhas com o próprio rabo”.

A edição de 12 de maio contou que o bebê-diabo ameaçou funcionárias de morte, rasgou travesseiros com os chifres e fugiu do hospital, saltando de uma janela no 3º andar. Nos dias seguintes, várias maldades do capetinha foram relatadas: ele andou por telhados, enlouqueceu uma mulher, acabou com um ritual umbandista e assustou um taxista, pedindo que o levasse “para o inferno”.

Apesar disso, o recém-nascido não teve vida fácil. Feiticeiros, fanáticos religiosos e até o Zé do Caixão se dispuseram a acabar com ele. Com o decorrer dos dias, a história foi esfriando e ganhando cada vez menos destaque no jornal. No começo de junho, foi noticiado que o bebê-diabo havia fugido para o Nordeste, após ter sido sequestrado por pessoas dispostas a queimá-lo vivo. O Notícias Populares, ainda tentou emplacar mais dois diabinhos, de outras cidades, um “bebê-peixe” e um “bebê atômico”, mas sem sucesso.

O Bebê Diabo chega em Cubatão.

Estamos no meio dos anos 70, naquela época o Brasil estava em plena Ditadura/Regime Militar, aonde noticias eram fiscalizadas pelos censores, naquela época as informações confiáveis eram obtidas em jornais e revistam além da televisão. Com o burburinho da saga do capetinha do ABC, não seria estranho dele chegar a outros cantos de São Paulo, afinal o boato e a melhor forma de espalhar as estória que ouvimos. No dia em que se encerrou sua saga no Notícias Populares, o Diabo em forma de Guri ganha uma 2° Parte. A do Jornal local de Cubatão, Jornal A Imprensa destaca a principal manchete. "Bebê-diabo bate carteira de operário em Cubatão."



O Bebê-diabo, depois de aterrorizar a população do Grande São Paulo, segundo manchetes de jornais, teria aparecido em Cubatão e "batido a carteira" de um operário que mora em alojamentos da Imigrantes. O operário José Celidônio Silva já teria comparecido à Polícia, onde prestou queixa contra o furto de dinheiro de sua carteira, em dias seguidos. O operário afirma que ficou dentro do barraco, à espera dos que ele imagina serem ladrões ou os próprios companheiros de quarto.

Mas qual não foi sua surpresa e espanto ao constatar que quem lhe roubava o dinheiro era o próprio Bebê-diabo. Na página 5, o relato completo sobre a suposta aparição do nenê-monstro em nossa cidade. Para alguns, tudo não passa da imaginação criadora do operário.
Reprodução parcial da página 5 do Jornal de 08/06/1975.

"Foi o Bebê-diabo, doutor. Foi o Bebê-diabo quem bateu a minha carteira".

O ar assustado de José Celidônio Silva, servente de pedreiro na Rodovia dos Imigrantes, deixou não só preocupada a autoridade, como todos os que se encontravam na delegacia.

José tremia sem parar e seus olhos, espantados, davam bem a impressão de que ele tomara contato com algum ente sobrenatural. Em vão as pessoas que se encontravam na sala procuravam acalmá-lo, afirmando que ele estava impressionado pelas recentes notícias em jornais a respeito do fenômeno que estaria ocorrendo no Grande São Paulo.

"Eu juro que foi o Bebê-diabo quem furtou a minha carteira. Ninguém vai me convencer do contrário pois passei alguns dias para comprovar isto e agora tenho certeza. Alguns amigos meus que moram na Cota 200 também podem me apoiar. É só o senhor chamá-los aqui".

A história - Minutos depois, mais calmo, mas lançando olhares desconfiados à porta, como se esperasse a qualquer momento a aparição de alguma alma do outro mundo, o servente iniciou a sua história:

"Eu moro no alojamento de uma firma que faz serviços gerais na Imigrantes. O barraco que eu ocupo é um dos mais afastados, e é ocupado por mim e mais dois colegas, o Adauto e o Nereu. Eles sempre saem à noite, voltando muito tarde, e eu, como costumo ficar sozinho, tranco a porta e a janela do barraco, para evitar perigos.

"No começo da semana passada, eu sofri um acidente no serviço e fiquei no seguro. Certa manhã, acordei (o Adauto e o Nereu já tinham ido trabalhar) e como precisava vir até o INPS, comecei a me arrumar. Quando peguei minha carteira e fui separar o dinheiro da passagem de ônibus, notei que ela estava vazia. Imediatamente, vasculhei os bolsos da calça, mas não encontrei os 123 cruzeiros que eu tinha.

"A minha primeira reação foi achar que tinha perdido tudo. Me conformei. Dois dias depois, novamente fui surpreendido com a falta de 20 cruzeiros na carteira. Aí comecei a ficar desconfiado dos meus dois companheiros de quarto! Eu os conhecia há alguns meses, mas não pra achar que eles não seriam capazes de fazer uma coisa destas.

"Então, pensei: 'Como eles saem quando ainda estou dormindo, é bem provável que se aproveitem disso pra esvaziar minha carteira'. Resolvi, então, vigiar.

"Durante dois dias, eu acordava mais cedo, e ficava deitado fingindo estar dormindo. O Nereu e o Adauto acordavam e iam para o trabalho, sem mexer nas minhas coisas. No entanto, doutor, nos dois dias sumiram 26 cruzeiros da carteira!"

À noite - "Achando que era à noite que os dois agiam, resolvi observar melhor. Sábado passado, quando Nereu e Adauto saíram para uma farra, eu me escondi dentro do guarda-roupa. Quem sabe eles me roubavam quando chegavam às altas horas da noite?

"Quando deu 11 e meia da noite, ouvi um barulho. Imediatamente comecei a olhar pelo buraco da fechadura do guarda-roupa. Apesar da porta do barraco ter sido aberta, eu notei um vulto se movimentando, aproximou-se de minhas coisas e começou a vasculhar. Eu não pensei em agarrá-lo, pois podia haver outra pessoa com ele e eu, machucado como estou, não iria aguentar uma briga.

"O vulto agarrou a minha calça, enfiou a mão num bolso, tirou a carteira e pegou o dinheiro. Quando ia saindo, um raio de lua o iluminou e eu notei que o sujeito era pequeno. 'Deve ser um moleque sem vergonha'. Imediatamente, abri a porta do guarda-roupa, e me precipitei sobre ele!!".

Aparição - Neste momento da história, João calou. Fitou a sua muda assistência, o olhar assustado, percorrendo todos os cantos da sala, pigarreou, e continuou:

"Doutor, foi o ato mais infeliz da minha vida... Quando eu me aproximei, o vulto virou-se para mim e o raio de lua me mostrou como ele era. Seus olhos brilhavam como holofotes, e me fitavam como se quisessem me hipnotizar! A boca aberta mostrava dois enormes dentes caninos e, no canto dos lábios, corria um líquido verde, gosmento. Tinha o tamanho de uma criança normal de 4 ou 5 anos. O corpo era todo peludo e não possuía uma das mãos.

"Fiquei aterrorizado! Imediatamente, o vulto abriu a porta e sumiu no pé da serra. Descontrolado, acabei desmaiando. No outro dia, bem cedo, meus dois colegas me encontraram. Quando eu lhes contei a história, pensaram que eu tinha bebido. Mas depois, ao verem duas marcas de pés de criança no assoalho, marcadas como se ele tivesse sido queimado, começaram a ficar em dúvida. Como iam trabalhar, mandaram que eu viesse aqui contar toda a história. Eu quero ficar cego agora, se inventei tudo isso".

Dizendo assim, João saiu, deixando a dúvida entre todos os que se encontravam no recinto.

Na edição seguinte, de 15 de junho de 1975, o mesmo Jornal A Imprensa voltava ao assunto:

Reprodução da Nota na 1° Página do Jornal em 15/06/1975

"BEBÊ-DIABO ARRANCA OPINIÕES - A história que o operário José Celidônio Silva teria contado em uma delegacia de que o bebê-diabo lhe teria batido a carteira, está causando polêmica em Cubatão. Muitos acreditam que o operário deveria no momento do furto estar completamente bêbado e que o álcool fez com que ele visse a imagem do bebê-diabo. Outros poucos acreditam na história do Celidônio. Na página 3, damos a opinião daqueles que não acreditam. Inclusive acusam este jornal por ter dado a notícia na edição anterior. Como não distorcemos os fatos, mostramos na íntegra tudo o que eles pensam sobre o diabo"
Cidade reage contra o Bebê-Diabo.

"Só mesmo um jornalzinho pode publicar assunto como o do bebê-diabo", disse o padre Baltazar Vicente Benito da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Lapa - Cubatão, ao ser perguntado sobre o assunto. Disse ainda que essa história não passa de fruto da imaginação de determinadas pessoas, e segundo suas palavras: "o Diabo existe, mas não encarna nas pessoas como dizem, isso de pessoas serem tomadas pelo demônio são interpretações distorcidas de algum distúrbio proveniente de problemas psicológicos, fora disso não há outras explicações, sendo que essas notícias, que surgem em jornais, não passam de manchetes para aumentar a venda e chamar atenção".

Já que afirmou que o Diabo não encarna nas pessoas, então porque da prática do exorcismo por padres? Padre Baltazar diz que "As ciências ocultas sempre existiram, e quanto à prática do exorcismo é muito rara, necessitando para isso uma série de provas e autorizações. São realmente muitíssimo raras". continua a dúvida: se o diabo não encarna nas pessoas, então porque o exorcismo?

Para o pastor Benedito Bruneli, da Igreja Evangélica Assembléia de Deus em Cubatão, a existência do diabo é ponto pacífico. "E tanto é verdade, que Jesus se sacrificou para nos salvar das garras demoníacas. E tão real quanto a existência do Sol e da Lua, pois para sabermos que o sol é realmente necessário, precisamos conhecer a lua, e vice-versa, mas esse caso do bebê-diabo que dizem andar apavorando a grande São Paulo não passa de manchete sensacionalista. Acredito mesmo que o diabo possa se apoderar de uma pessoa de ideia fraca, pois essas pessoas são verdadeiras portas abertas aos espíritos das trevas. Somente assim se explica a encarnação do demônio, pois como relatou o apóstolo Paulo, a luta dos crentes em Deus é contra as potestades, contra os príncipes das trevas, contra as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais".

Interpelada sobre o provável nascimento desse bebê-diabo, dona Sebastiana, do Centro Espírita Santa Bárbara, disse que: "Acredito que tenha nascido uma criança desse jeito sim, pois nesse mundo tudo pode acontecer, o que nos parecia fora do comum há alguns anos, hoje já é encarado normalmente. O Satanás existe, e ele pode fazer muita coisa para provar sua existência, até mesmo dar a entender aos homens da sua inexistência, e ele pode encarnar nas pessoas, nas de espírito fraco, porque naquelas que acreditam realmente em Deus e têm fé, jamais o Satanás chegará perto, pois a força dele não é tão forte quanto a de Deus, mas com relação a esse homem aqui de Cubatão que foi assaltado pelo bebê-diabo, eu não acredito, assim como também não acredito em outras histórias sobre o que essa criança-monstro anda fazendo, tudo isso deve ser uma grande perturbação, ou uma brincadeira de muito mau gosto".

Já o soldado Souza diz que não acredita em hipótese alguma sobre essa criança. Segundo ele: "O que deve ter acontecido foi ter nascido uma criança anormal, mas com aspecto de diabo nunca. Eu não acredito no diabo, muitos acreditam, todo o boato em um fundo de verdade, mas chegar a ser assaltado pelo diabo: Para que ele iria querer dinheiro:"

O pastor José Marques, da Igreja Batista da Vila Nova, diz que há muito mais provas da existência do diabo, provas essas mais concretas, pois presenciamos diariamente as manifestações do demônio, através desse desamor que abala atualmente a humanidade, esses crimes que se cometem, esse desespero em viver tudo de uma só vez, portanto essas manifestações são mais evidentes da existência do mesmo, do que esse bebê-diabo que andam dizendo que nasceu, e isso pode ir longe, pois as coisas ruins se propagam facilmente".

Para dona Nazir, da Vila Parisi, o diabo existe, o bebê não, disse que se um dia vir em sua frente algo parecido com o demônio, morreria só de susto. "Imagine ver um bebê - assim, é claro que o diabo pode tomar conta de uma pessoa".

O Chicão, com mais de 50 anos vividos em Cubatão e com mais de 70 anos de idade, diz não acreditar em nada disso, pois "ainda não se encontrou com o diabo, 'só acredito nessa de bebê-diabo se eu puder ver com os meus próprios olhos, e puder segurar o bicho pelos chifres, caso contrário..., digo isso porque desde antes de Cristo já existiam os espertalhões em matéria de propaganda e que faziam a vida através da credulidade dos outros. Quanto ao que dizem nos jornais, como posso acreditar, está só escrito no papel, isso não prova nada".

"Eu sei que o diabo existe, tem até poderes dados por Deus, mas essa coisinha que dizem que nasceu com chifre, nunca. O que pode ter acontecido foi uma anedota bem inteligente, afinal a Medicina está tão adiantada, não é mesmo?".

Reprodução da Página 3 do Jornal em 15/06/1975.

O misterioso personagem reapareceria na edição de 27 de julho de 1975 desse jornal, na página 3, coluna Chave de Cadeia:


CHAVE DE CADEIA

Outra vez???

De uma maneira ou de outra ele aparece. Seja num papo, seja numa queixa, seja numa notícia, ele está sempre causando suas dúvidas. Estamos falando do Bebê-diabo, aquele sujeitinho que, com apenas 3 anos de idade, já tem 2 chifres e um rabinho com ponta de flecha.

Não é que o Bazar, barbeiro do salão Primavera, é capaz de jurar que cortou o cabelo do danadinho a semana passada? "Pergunta aí pro Paraíba se não é verdade!" (Paraíba é um outro barbeiro).

Segundo o Bazar, o sujeitinho apareceu, sentou na cadeira e não falou nada. Como tem uma senhora que sempre leva o filhinho dela no salão, senta o garoto na cadeira e deixa lá para que sejam cortados seus cabelos, a coisa pareceu normal e o Bazar nem pestanejou, quando viu o sujeitinho.

Pegou a máquina elétrica e começou a largar uma brasa. Ele estranhou que o cabelo do fi' da mãe era duro que nem piaçaba, mas não ligou. Passada meia hora, depois que a máquina engripou três vezes e teve quaro lâminas quebradas, o Bazar acabou.

O sujeitinho levantou e foi embora. Enquanto o Bazar estava comentando com o seu Paulo, dono da barbearia, a dureza do cabelo do freguês, apareceu a mulher e disse: "Amanhã eu trago meu filho pra cortar o cabelo". Aí o Bazar perguntou: "Ué! e não era ele que tava aqui ainda agorinha?" A mulher respondeu: "De jeito nenhum! Eu não tive tempo de trazer ele aqui".

Aí o Bazar tremeu da cabeça aos pés. Para acalmá-lo, deram-lhe três copos de Toddy.

Reprodução parcial da página 3 do Jornal de 27 de Julho de 1975.
E o diabólico bebê ainda aprontaria mais uma em Cubatão, antes de sumir dos noticiários. O fato foi registrado na página 3 da edição de 16 de novembro de 1975 do mesmo Jornal A Imprensa:

Reprodução parcial da página 3 do Jornal de 16 de Novembro de 1975

CHAVE DE CADEIA

Apenas pra registrar

Aqueles que tinham medo do Bebê-diabo, agora vão ter motivo pra tremer mais ainda. Está aparecendo em São Paulo o "Bebê-atômico" e, logo, logo, a gente vai ouvir dizer que o Bazar, um barbeiro muito popular na cidade, cortou o cabelo da ferinha. Cuidado, hein, rapaz, senão ele acaba batendo sua carteira também.

Como Realmente Nasceu o Bebê Diabo.

Notícias Populares,era notório por bolar notícias sensacionalistas, afinal foi o único jornal que durante um mês explorou a odisseia do herdeiro do demônio em suas páginas. 

Em maio de 1975, o repórter Marco Antônio Montadon, da Folha de S.Paulo, foi ao ABC confirmar o relato de que havia nascido uma criança com “duas saliências na testa” (chifres) e “prolongamento no cóccix” (rabo). Mas eram apenas más formações, que foram corrigidas com uma breve cirurgia.

Montadon transformou a história numa crônica (fictícia) de terror, na Folha. O secretário de redação do NP, José Luiz Proença, e o editor de polícia, Lázaro Campos Borges, convocaram um repórter para “repaginar” esse texto e transformá-lo na notícia do nascimento do bebê-diabo. O Notícias Populares foi hábil em procurar fontes oficiais (como médicos e diretores do hospital), mas usar a negativa deles de modo que gerasse ainda mais suspeita no público.

O desmentido da história do bebê-diabo foi dado pelo próprio autor em 2008, no site JB Wiki, ligado ao Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro.

"Em 1975 eu trabalhava pela manhã como repórter policial no jornal Correio Metropolitano, em Santo André, no ABC, e à tarde no jornal Notícias Populares, pertencente ao Grupo Folha, como repórter especial. José Lázaro Borges Campos, falecido, amigo inesquecível, era o editor de polícia do NP. Ibrahim Ramadan, nessa época, o diretor de redação. Eu e o "Lazão", assim ele era conhecido, morávamos em Santo André e todos os dias seguíamos juntos para o NP, no 5° andar da Folha de S. Paulo, na Alameda Barão de Limeira. No mês de maio daquele ano corria forte um boato dando conta do nascimento de um bebê que tinha chifres e rabo, num hospital de São Bernardo, ABC, que aterrorizava enfermeiras, médicos, falava grosso e até soltava fogo pela boca.


Com o passar dos dias, o boato se alastrou de tal forma que em todos os cantos das sete cidades do ABC só se falava nessa estranha criatura. Não faltavam padres, médicos, psiquiatras, pessoas do povo e até dados científicos para comentar sobre um possível nascimento de uma criança-monstro nesse hospital de São Bernardo. Com tantos comentários, Lázaro Campos me incumbiu de apurar os fatos e escrever uma nota sobre esse boato para o NP de domingo. Falei com a direção do Hospital São Bernardo, enfermeiras (os) e médicos. O engraçado é que algumas enfermeiras mostravam nervosismo e chegavam até a rezar o Pai Nosso quando eu tocava nesse assunto. Na verdade, garantiram-me os médicos, um bebê nascera com um prolongamento no cóccix e duas pequenas saliências na testa, problemas resolvidos com uma simples cirurgia na própria maternidade.

Escrevi esse relato, sem nenhum sensacionalismo, no dia 10 de maio de 1975, um sábado e deixei o texto, de 30 linhas, sobre a mesa do Lázaro. O jornal estava para ser fechado e eu desci para esperá-lo na padaria da esquina. Fomos embora juntos, sem comentar nada sobre jornal. No domingo pela manhã percebi que a banca de revistas perto de casa estava repleta de pessoas comprando o NP. Curioso, me aproximei e consegui o último exemplar que trazia a seguinte manchete: Bebê-diabo nasce em SBC". Fui à página 5 e gelei. Minha assinatura estava abaixo da manchete forçada. Fiquei apavorado, temendo processo e a demissão do jornal por justa causa.
Quando Lázaro Campos passou em casa, me recusei a sair para trabalhar. Mas, com seu jeito "mineiro", me convenceu, afirmando que assumiria a culpa da manchete, caso a direção se manifestasse desfavoravelmente. Entrei cabisbaixo no prédio da Folha. Na verdade, estava apavorado. Fiquei mais ainda quando recebi o aviso para me dirigir, imediatamente, com o Lázaro, à sala de Octávio Frias de Oliveira, dono do Grupo Folha. Entramos assustados na sala de Frias, esperando um sermão, antes da demissão. Pelo contrário. O homem, que eu ainda não conhecia pessoalmente, estava sorrindo e nos estendeu a mão, cumprimentando pela manchete e informando que, pela primeira vez na história, o NP bateu todos os recordes de venda em bancas.


Custei a acreditar que tudo aquilo era verdade. Segurava a xícara com café, oferecida pelo Frias, com dificuldade, tremendo e ouvindo somente elogios. E a ordem era para darmos sequência no assunto. E assim foi feito. A notícia tornara-se uma bola de neve. A tiragem do periódico, que era de 80 mil exemplares, ultrapassara a marca dos 200 mil. O povo acreditou na história e o NP começou a inventar uma saga para o bebê-diabo. O caso permaneceu na primeira página do jornal por inacreditáveis 37 dias.


Nas manchetes que seguiram, o bebê-diabo infernizou pessoas, pulou em telhados, pediu sangue para beber, tocou campainhas, palitou os dentes com um facão e até parou um táxi à noite, deixando o motorista assustado ao falar que o destino da corrida seria o inferno. Amado por uns, odiado por outros e temido por milhares, o bebê-diabo aterrorizou moradores de São Paulo e do Brasil, mesmo sem ter existido."

A história da gênese do bebê-diabo também é relatada em meio a uma entrevista do editor-chefe do Notícias Populares, Ebrahim Ramadan, ao blogue Notícias Populares - Dezoito anos por trás das manchetes do NP, do jornalista Antonio Marcos Soldera.

"A notícia sobre o bebê-diabo saiu primeiro na Folha de S.Paulo. Eles não publicaram nos moldes que nós publicamos, mas a matéria sobre o nascimento de uma criança diferente a gente leu na Folha, inclusive com uma charge de um cara vendendo pipoca ali na frente do hospital. E aí nós ligamos para o Hospital, para confirmar se era verdade. E o hospital ficou empurrando para os médicos, não podemos falar sobre isso e coisa e tal. Daí nós tocamos pra frente.  Mas foi a Folha quem deu a dica para a gente. Claro que eles não deram ‘bebê-diabo’, eles deram de uma forma diferente. Era um domingo (10 de maio de 1975), dia que quase não tem matéria boa para manchete. Ligamos para o hospital lá de São Bernardo, várias vezes, ninguém queria dar informação nenhuma, então fomos na esteira da Folha e publicamos a notícia. No dia seguinte estourou. Às 10 horas da manhã não tinha mais jornal. A partir do terceiro ou quarto dia começaram a aparecer pessoas no jornal que viram o bebê-diabo. Havia uma espécie de cumplicidade entre o leitor e o NP. Um cara disse que viu o bebê-diabo no telhado de uma casa. É claro que nenhum leitor dificilmente acreditaria nisso, mas era um negócio interessante, tinha gente que gostava de ler exatamente por causa dessa cumplicidade. Foram 25 dias de manchetes. Outro dia o meu filho estava no avião e leu numa dessas revistas de bordo uma matéria sobre o NP que trazia uma manchete do bebê-diabo que eu não me lembrava, que me fez dar risada: ‘Bebê-Diabo pega táxi na Rio Branco e manda o motorista seguir para o inferno’.

Em Franco da Rocha houve uma inundação violenta. Morreu gente até. E o pessoal de lá começou a mudar. Mas não foi por causa da enchente. É que começou a correr um boato, e nós publicamos como boato mesmo, que nasceu um bebê em Franco da Rocha e que teria ele dito a seguinte frase: ‘Isso não é nada; o pior virá depois’. Claro, nós publicamos como boato e muita gente estava mudando de Franco da Rocha. Isso rendeu uma semana de manchete. Aí a gente publicava que isso era um boato e que não tinha nada a ver com a enchente, que o serviço de meteorologia dizia que a chuva estava nas previsões."

A história também não é original. Poucos anos antes, O Bebê de Rosemary (1969) causou pânico parecido no Brasil e no resto do mundo. Outro filme recente na época que também causou polêmica foi O Exorcista (1974).

O público do NP era composto de pessoas mais simples, com maior tendência a se apegar a crendices sobrenaturais. Meses antes, o próprio jornal já havia soltado matérias sobre a “loira fantasma” e o “vampiro de Osasco”, por exemplo.

A Saga Do Bebê-Diabo Nas Manchetes Do Notícias Populares.

11/5 Nasceu o diabo em São Paulo
12/5 Bebê-Diabo desaparece
13/5 Feiticeiro irá ao ABC expulsar o Bebê-Diabo
14/5 Bebê-Diabo do ABC pesa 5 quilos
15/5 Bebê-Diabo inferniza o padre do ABC
16/5 Nós vimos o Bebê-Diabo
17/5 Povo vai ver o Bebê-Diabo
18/5 Procissão expulsará Bebê-Diabo
19/5 Viu Bebê-Diabo e ficou louca
20/5 Santo previu o Bebê-Diabo
21/5 Bebê-Diabo nos telhados das casas do ABC
22/5 Médico afirma: o Bebê-Diabo nasceu no ABC
23/5 Diabo explode mundo em 1981
24/5 Bebê-Diabo parou táxi na avenida
25/5 Fazendeiro é o pai do Bebê-Diabo
26/5 Bebê-Diabo viaja para ver o pai
27/5 Bebê-Diabo aparece no lugar do eclipse
28/5 Mais 7 viram o Bebê-Diabo
29/5 Bispo morre de medo
30/5 Bebê-Diabo arrasa com ritual umbandista
31/5 Fanáticos ameaçam Bebê-Diabo no ABC
1/6 Sequestrado Bebê-Diabo
2/6 Bebê-Diabo à morte
3/6 Bebê-Diabo foge para o Nordeste
4/6 Padre de Marília: "Eu acredito no Bebê-Diabo do ABC"
5/6 Zé do Caixão vai caçar Bebê-Diabo no Nordeste
8/6 Povo vê novo Bebê-Diabo do ABC

Adendo.

O caso do Bebê-Diabo não foi o único em termos de matérias jornalisticas que beiravam o absurdo. Depois de tanto absurdo (e de milhões de exemplares vendidos), o NP resolveu encerrar o assunto quando o "bebê-diabo" havia se perdido nos sertões da Bahia e Pernambuco. E retornado ao ABC Paulista. Logo outro bebê foi manchete, Guta, a "Bebê Atômico"

Porém, o departamento comercial pressionou (Afinal com o Bebê-Diabos eles ganharam milhões com os exemplarem durante a saga) e, pouco depois, o jornal apelaria novamente com a notícia de nascimento de um "bebê peixe" na floresta amazônica, com "pele escamosa e cauda de peixe nos membros inferiores". A segunda manchete foi: "Boto é pai do bebê-peixe", em que um médico explicava que a mãe tivera relações sexuais com um "cetáceo fluvial". Saturado pelo "bebê diabo", o público não deu bola e as edições encalharam. Aí, o NP decidiu esculhambar de vez. Em 11 de novembro de 1975, lia-se que "Bebê atômico nasceu em SP". A criança, chamada Guta, tinha o poder de controlar raios e relâmpagos, além de ficar invisível e transformar seu corpo em substância líquida e gasosa. Pior: ela morava no esgoto e passeava por bairros distantes porque, no Centro de São Paulo, as ondas de rádio e TV lhe faziam cócegas.

Segundo o jornal, o pai do bebê, um pedreiro, tivera contato com uma pistola de raios alimentada por urânio enriquecido, "a mesma fonte de energia dos submarinos nucleares". Assim, no dia 14 de novembro, a notícia era a de que a médica Vânia teria recebido uma visita de Guta, que saíra junto com o vapor do chuveiro e, sorridente, se materializara em sua frente (!). Em seguida, a garotinha nuclear parou em uma oficina para recarregar as energias com a bateria de um carro Galaxie azul. Mas a loucura chegou ao ápice quando a garota entrou em uma bar da Vila Prudente para beber todo o leite gelado do local (sua bebida preferida) e, ao mesmo tempo, ordenar: "Quando eu bebo, todo mundo bebe também. Aqui não vai ficar ninguém sem tomar pelo menos uma garrafa de pinga". O livro "Nada mais que a verdade" observa que, talvez, esse fosse o desejo inconsciente do repórter que escreveu essa pérola...

Sem o mesmo sucesso do "bebê diabo", a nova série acabou quando Guta quase morre, quando levou um tiro de chumbinho do proprietário da lancha Tiririca, às margens da represa de Guarapiranga.

Fontes.

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