Nas altas horas da noites, depois de enche o caneco, o boêmio caminha mais para lá do que para cá pelas ruas, quando um estranho o para pedido para acender um cigarro. O pútrido perfume de carne já passada do ponto incomoda o nariz, acompanhado de um hálito de enxofre exalado pelo elegante cavalheiro de pele esverdeada.
Sim esverdeada, não corada, tão pouco morena ou curtida pelo sol. Ainda meio bêbado observa a face do curioso cavalheiro. Um morto-vivo, um cadáver que se recusar a morrer, um caminhante do pós-vida que mesmo depois de ter passado do ponto teima em passear pelas ruas do Recife em busca de algo.
Não se sabe o que foi em vida. Talvez seja alma penada de um malandro que cometeu todos os pecados da boemia; namorou muitas mulheres, apostou todo dinheiro em jogos de azar e bebeu além da conta. Nunca saberemos. Talvez tenha sido funileiro, alfaiate, soldado, marinheiro, rico, pobre, mendigo, ladrão, doutor, padeiro, sapateiro.
Ou talvez seja a encarnação de um espírito maligno, que tanto fascina com seu figurino impecável e seus dentes de ouro, que é seu cartão de visita para os desavisados, quanto provoca repulsa com sua face pútrida de defunto insepulto.
Boca-de-Ouro, como ficou conhecido pelos que o viram, é um ser misterioso que, sob as vestes de boêmio, esconde um misto de zumbi e demônio. Gilberto Freyre cita, no livro “Assombrações do Recife Velho”, que essa visagem não era exclusiva do Recife, tendo também sido registrada em outras cidades do Brasil. É uma assombração cujas primeiras aparições datam do início do século XX. Nas horas mortas, o Boca-de-Ouro é visto ao longe, caminhando lentamente e fumando um cigarro. Veste sempre um paletó branco, sapatos bem engraxados e usa chapéu tipo “Panamá” – uma figura que lembra o “Zé Pilintra”, entidade cultuada pela Umbanda.
Ele aborda caminhantes solitários que vagam pelas ruas desertas e sempre pede fogo a esses desavisados – gente que sai de festa ou de barezinhos da moda do Bairro do Recife, por exemplo. Tendo ou não fósforo (ou isqueiro) para oferecer, a vítima toma um grande susto quando percebe que boêmio misterioso tem a cara carcomida de um cadáver apodrecido e exala um forte cheiro de enxofre.
Quando a pessoa sai correndo, o zumbi solta uma tenebrosa gargalhada e exibe sua boca cheia de dentes de ouro. E não adianta fugir: quando a vítima chega às carreiras à outra esquina (ou encruzilhada), o zumbi boêmio está lá, soltando outra risada medonha. Esse pesadelo se repete, esquina após esquina, ao longo de toda a rota de fuga, até que o coitado caia desfalecido pelo pânico e pela exaustão.
Na amanhã seguinte, é encontrado desmaiado na calçada. Socorrido pelos passantes, conta como foi seu insólito encontro com o Boca-de-Ouro. Claro que quase ninguém acredita e o sujeito é avaliado como pinguço ou mesmo como doido.
Ao que parece, o Boca-de-Ouro prefere atormentar homens que buscam aventuras ou estão simplesmente perdidos na noite. Nunca é visto por um grupo amigos ou um casal a caminhar pelas ruas num passeio noturno.
Fontes. 170 de 186
http://www.orecifeassombrado.com/assombracoes/o-boca-de-ouro-2/
https://www.mundosombrio.com.br/boca-de-ouro-lenda-urbana/
https://sombrasdorecife.com.br/quadrinhos/boca-de-ouro/
https://www.zona33.com.br/2017/12/10-lendas-brasileiras-assustadoras.html
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