terça-feira, 10 de julho de 2018

Revolução Constitucionalista de 1932. 2° Parte.

Em 9 de Julho de 1562, incomodados com a aliança entre tupiniquins e portugueses, os índios tupinambás, unidos na Confederação dos Tamoios, lançam uma série de ataques contra a vila de Piratininga. Tal episódio ficou conhecido como o Cerco de Piratininga. A defesa organizada por Tibiriçá e João Ramalho impede que os tupinambás entrem em São Paulo, e os obriga a recuar, em 10 de julho do mesmo ano.

370 anos mais tarde, Getúlio Vargas era o "Presidente" do Brasil. Presidente é apenas é o modo de falar, já que o mesmo não chegou lá pelos votos, 2 anos antes em 1930, Getúlio não foi eleito presidente. Porém, inconformado com o fracasso das eleições, procurou o apoio dos estados de Minas Gerais, Rio Grande de Sul e Paraíba para impedir que o candidato eleito (Júlio Prestes) tomasse posse. Graças ao apoio militar adquirido, Getúlio assumiu o comando do país.

E deu treta, muita treta.

O Festim da Revolução.

Começou-se, então, a se tramar um movimento armado visando à derrubada da ditadura de Getúlio Vargas, sob a bandeira da proclamação de uma nova Constituição para o Brasil. Desde seu início, a revolução de 1932 contou com o apoio decisivo da Maçonaria Paulista, através de suas lideranças e de seus membros como Pedro de Toledo, Júlio de Mesquita Filho, Armando de Sales Oliveira, Ibrahim de Almeida Nobre e outros.

Em 9 de julho, Getúlio Vargas já havia estabelecido eleições para uma Assembleia Nacional Constituinte (as eleições foram convocadas em fevereiro de 1932) e já havia nomeado um interventor paulista - as duas grandes exigências de São Paulo. Porém a interferência do governo federal e dos tenentes em São Paulo continuava forte. Os tenentes do Clube 3 de outubro eram contra a instalação de uma assembleia constituinte, tendo seus representantes entregado a Getúlio Vargas, em 3 de março de 1932, em Petrópolis, um manifesto contrário à constituinte, no qual dão seu total apoio à ditadura e no qual se manifestam contrários a uma nova constituição.

Estes atos do Governo Provisório, porém, não evitaram o conflito, já que o PRP, agora unido ao seu rival Partido Democrático paulista, almejava voltar a dominar a política nacional, como fazia anteriormente, dar uma constituição ao Brasil e terminar com as interferências da ditadura no governo de São Paulo. Era especialmente humilhante para São Paulo a nomeação do major Miguel Costa para comandante da Polícia Militar de São Paulo, então chamada de Força Pública, pois Miguel Costa havia sido expulso da Força Pública em 1924 por tentar derrubar o governo paulista na Revolução de 1924.

O combatente-médico da revolução de 1932, Ademar Pereira de Barros, que governaria São Paulo por três vezes, assim explicou, em Santos, em 1934, as razões da revolução de 1932:
“São Paulo levantou-se em armas em 9 de julho de 1932 para livrar o Brasil de um governo que se apossaria de sua direção por efeito de uma revolução… e se perpetuava indefinidamente no poder, esmagando os direitos de um povo livre.. e que trazia o sempre glorioso São Paulo debaixo das botas e do chicote do senhor!”
Conflito Armado.
Cartaz convocando os paulistas às armas. E interessante notar que existe um paralelo entre este
cartaz, do Soldado da Revolução Constitucionalista, a outro famoso cartaz, o Tio Sam, que foi
reinterpretado por um combatente paulista determinado a lutar contra o regime que chegou ao
poder com a Revolução de 1930. Entre outros pontos, pode-se destacar como os meios de
 comunicação da época apresentavam uma notória integração com o cenário internacional.
Em 9 de julho eclodiu o movimento revolucionário, com os paulistas acreditando possuir o apoio de outros estados, notadamente Minas Gerais, Rio Grande do Sul e do sul de Mato Grosso, para a derrubada de Getúlio Vargas. Pedro de Toledo, que ganhara forte apoio dos paulistas, foi proclamado governador de São Paulo e foi o comandante civil da revolução constitucionalista. Foi lançada uma proclamação da "Junta Revolucionária" conclamando os paulistas a lutarem contra a ditadura. Formavam a Junta Revolucionária Francisco Morato do Partido Democrático, Antônio de Pádua Sales do PRP e os generais Bertoldo Klinger e Isidoro Dias Lopes. O general Euclides Figueiredo assumiu a 2º Região Militar.

Alistaram-se 200.000 voluntários, sendo que se estima que, destes, 60.000 combateram nas fileiras do exército constitucionalista. No estado de São Paulo, a Revolução de 1932 contou com um grande contingente de voluntários civis e militares e o apoio de políticos de outros estados, antigos apoiadores da Revolução de 1930, como, no Rio Grande do Sul, Raul Pilla, Borges de Medeiros, João Batista Luzardo, Glicério Alves e João Neves da Fontoura, entre outros, que formaram a Frente Única Rio-Grandense, e que tentaram fazer uma revolta mas foram capturados (salvo Batista Luzardo, que conseguiu fugir) e exilados pelo interventor gaúcho.

No atual Mato Grosso do Sul foi formado um estado independente que se chamou Estado de Maracaju, que apoiou São Paulo. Em Minas Gerais, a revolução de 1932 obteve o apoio do ex-presidente Artur Bernardes, que terminou também exilado. São Paulo esperava a adesão do interventor do Rio Grande do Sul, o estado mais bem armado, mas este na última hora decidiu enviar tropas não para apoiar São Paulo, mas para combater os paulistas.

Quando se inicia o levante, uma multidão sai às ruas em apoio. Tropas paulistas são enviadas para os fronts em todo o estado. Mas as tropas federais são mais numerosas e bem-equipadas. Aviões são usados para bombardear cidades do interior paulista. Quarenta mil homens de São Paulo enfrentam um contingente de cem mil soldados.[28] Os planos paulistas previam um rápido e fulminante movimento em direção ao Rio de Janeiro pelo vale do Paraíba, com a retaguarda assegurada pelo apoio que seria dado pelos outros estados.

Cartaz do M.M.D.C convocando o povo
paulista às armas.
Porém, com a não adesão dos outros estados, o plano imaginado por São Paulo não se concretizou: Rio Grande do Sul e Minas Gerais foram compelidos por Getúlio Vargas a se manterem ao seu lado e a publicidade de pretensão separatista do movimento levou São Paulo a se ver sozinho, com o apoio de apenas algumas tropas mato-grossenses, contra o restante do Brasil. Comandadas por Pedro de Toledo, aclamado governador revolucionário, e pelo general Bertoldo Klinger, as tropas paulistas se viram lutando em três grandes frentes: o vale do Paraíba, o Sul Paulista e Leste Paulista. O estado de São Paulo, apesar de contar com mais de quarenta mil soldados, estava em desvantagem, pois, se encontrava num grande cerco militar.

Como as fronteiras do estado foram fechadas, não havia como adquirir armamento para o conflito fora do país. Assim muitos voluntários levaram suas armas pessoais, e engenheiros da Escola Politécnica do Estado (hoje EPUSP) e do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) passaram a desenvolver armamentos a serem produzidos pelo próprio estado para suprir as tropas. Um navio que trazia armamento dos Estados Unidos para os paulistas foi apreendido pela Marinha do Brasil.

Em 23 de julho de 1932, durante testes com um novo morteiro projetado pelos engenheiros da Escola Politécnica de São Paulo, um acidente matou o então Comandante da Força Pública, coronel Júlio Marcondes Salgado e também o major da mesma corporação, José Marcelino da Fonseca. O tenente-coronel Herculano de Carvalho e Silva veio posteriormente a assumir o Comando da instituição.

Uma das armas mais sofisticadas feitas pela indústria paulista foi o trem blindado, que foi utilizado nos denominados setores leste, norte e sul de combate. São Paulo criou moeda própria, que foi falsificada pelo Governo Vargas e distribuída na capital paulista para desestabilizar a economia do estado. O dinheiro paulista era lastreado pelo ouro arrecadado pela campanha "Ouro para o bem de São Paulo", também chamada de "Ouro para a vitória". Devido à falta de munição, os paulistas inventaram e passaram a usar um aparelho que imitava o som das metralhadoras, chamado de "matraca".

A maçonaria paulista teve participação ativa no movimento constitucionalista de 1932 através de suas lojas e de seus membros como Pedro de Toledo, interventor, Júlio de Mesquita Filho diretor do jornal "O Estado de S. Paulo" e o poeta Ibrahim de Almeida Nobre entre outros.

O movimento contou com a contribuição de muitas mulheres voluntárias que se dedicavam em diversos serviços em benefício das tropas, como, por exemplo, serviços de enfermaria, serviços administrativos, confecção de uniformes militares, produção de alimentos, entre outros. Uma das mais notórias voluntárias nos serviços de saúde das tropas paulistas foi a médica Carlota Pereira de Queiroz, responsável por ter organizado e liderado um grupo de 700 mulheres para garantir a assistência aos feridos. Contudo, houve casos de mulheres que se voluntariaram para atuar nas trincheiras paulistas como soldados. Maria Sguassábia, professora de escola rural primária em São João da Boa Vista, foi uma dentre as mulheres que se voluntariaram para atuar nas trincheiras como soldado, a exemplo de Nhá Chica e de Maria José Bezerra. Ao longo do conflito, Sguassábia chegou a ser promovida a sargento devido aos seus feitos no campo de batalha. Era integrante da Coluna Romão Gomes, tendo atuado no denominado setor leste, na região de Campinas.

Houve intensa mobilização através do rádio, uma novidade na época, destacando-se César Ladeira da Rádio Record. Usaram-se muita propaganda e contra-propaganda ideológica por parte do Governo Federal, que acusava São Paulo de estar nas mãos do fascismo italiano trazido pelos imigrantes. Brasileiros de outras regiões eram recrutados pela ditadura para combater São Paulo, sob a justificativa de que São Paulo queria se separar do Brasil.

Cartaz de convocação de enfermeiras
voluntárias.
A ditadura colocava elementos infiltrados em reuniões e comícios em São Paulo que pregavam o derrotismo e o desânimo da população.

Um ato bárbaro ocorrido durante a Revolução de 1932 se deu na cidade de Cunha, quando as tropas federais torturaram e mataram o agricultor Paulo Virgínio por este se recusar a dizer onde estavam as tropas paulistas. Paulo Virgínio foi obrigado a cavar sua própria sepultura e morreu dizendo:
“Morro mas São Paulo vence!”
Paulo Virgínio, junto com os jovens do M.M.D.C, está enterrado no ponto central do Mausoléu do Ibirapuera e é homenageado dando seu nome a rodovia SP-171, que corta a região onde ele foi assassinado, o Vale do Paraíba. O movimento estendeu-se até 2 de outubro de 1932, quando foi derrotado militarmente.

Outro episódio que ficou marcado como exemplo de coragem e determinação a causa durante o conflito foi o ocorrido com o Capitão do Exército Constitucionalista do setor norte, Manuel de Freitas Novaes Neto. Durante uma missão nos arredores de Queluz, cidade já tomada pelas forças adversárias, foi rendido por um sargento do Exército Federal que teria dito no ato: "Renda-se paulista!". Contudo, o capitão paulista ao resistir a prisão teria dito:
“Um Paulista morre, mas não se rende!”
Ao avançar em assalto sobre o sargento federal, foi fuzilado no ato. Resgatado ainda com vida por uma patrulha paulista das proximidades veio a falecer horas depois na Santa Casa de Misericórdia de Cruzeiro. A morte do "Capitão Neco", como era conhecido na sua cidade natal, gerou comoção tanto entre os paulistas quanto no Exército Federal, onde também era muito estimado. Ele foi sepultado no cemitério particular de sua família na Fazenda Boa Vista, em Cruzeiro. Em 5 de julho de 1962, seus restos mortais foram transladados para o Mausoléu ao Soldado Constitucionalista de 1932 no Obelisco do Parque Ibirapuera.

Separatismo.

Entre os grupos que formavam a direção da Revolução Paulista, existiam os separatistas que desejavam a independência de São Paulo como uma república soberana ou a formação de uma federação onde os estados adquiririam a soberania (confederação). Entre os principais defensores do separatismo destacavam-se o presidente do Tribunal de Justiça, Costa Manso, os escritores José Alcântara Machado e Monteiro Lobato e o historiador Alfredo Ellis Junior.

Monteiro Lobato, especificamente, foi o que mais deixou documentos e relatos sobre o desejo de independência dos paulistas. Em 10 de agosto, depois de um mês de conflitos, o famoso autor enviava uma carta emocionada a Waldemar Ferreira, um dos líderes da revolução, na qual apresentava um balanço da crítica situação em que se encontrava São Paulo, observando ao seu amigo que “há o que a boca diz e há o que o coração sente. Minha boca diz o que todos neste momento dizem – mas meu coração, e talvez o de São Paulo inteiro, sente o que vai escrito nas tiras anexas”. E o que o coração de Lobato expressava traduzia-se num texto intitulado “A defesa da vitória de São Paulo”, em que deixava claro que, para os paulistas, só havia dois caminhos: hegemonia ou separação.
“Após a vitória de São Paulo, na campanha ora empenhada, se faz mistér que seus dirigentes não se deixem embalar pelas ideias sentimentais de brasilidade, irmandade e outras sonoridades.[...] Ou São Paulo desarma a União e arma-se a si próprio, de modo a dirigir doravante a política nacional a seu talento e em seu proveito, ou separa-se.[...] Trata-se de uma guerra de independência disfarçada em guerra constitucionalista...”
Monteiro Lobato, admirador de Washington Luís, apoiou a candidatura do Júlio Prestes, que, como presidente de São Paulo, realizara explorações de petróleo em território paulista, tendo escrito a ele, em 28 de agosto de 1929, uma carta de apoio em que dizia:
“Sua política na presidência significará o que de mais precisa o Brasil: continuidade administrativa!”
A professora Maria Sguassábia foi
voluntária nas trincheiras paulistas.
Créditos: Wikipédia.
A gigantesca campanha pela adesão das massas às causas revolucionárias, por pautar-se no enaltecimento de valores regionais, trazia em seu bojo o fortalecimento dos argumentos separatistas, ideário presente em São Paulo durante toda a sua história. Retratando a síntese desse paradoxo, Mário de Andrade registrava que o lema "Tudo por São Paulo" – que se fazia presente em faixas, veículos e nos quepes dos soldados – era “a única unanimidade” naqueles agitados dias de 1932. Definitivamente, foi “por São Paulo” – e não pelo Brasil – que tantos homens e mulheres se sacrificaram. O autor ainda, após o armistício, manifestava ao amigo mineiro Carlos Drummond de Andrade o rancor que lhe dominava a alma:
“No momento, eu faria tudo, daria tudo para São Paulo se separar do Brasil.”
De fato, o governo provisório especulava inicialmente se haveria um possível objetivo de secessão do Estado de São Paulo do restante do Brasil. No entanto, tal objetivo entre os lideres revolucionários jamais foi comprovado como fidedigno. Porém, Getúlio Vargas aproveitou-se do argumento separatista, utilizando isso de forma eficaz na sua estratégia de propaganda política para angariar aliados, voluntários e a rejeição popular no restante do país contra o movimento revolucionário articulado pelos paulistas.

Frentes de combate
Setor Norte

O Vale do Paraíba, denominado pelo comando das tropas paulistas como "Setor norte", era comandado pelo então coronel Euclides Figueiredo e na época era o principal acesso para o Rio de Janeiro. Assim, o Vale do Paraíba era visto pelos paulistas como principal teatro militar da revolução. O plano das tropas constitucionalistas previa a tomada da cidade fluminense de Resende, que chegou a ser bombardeada pela artilharia paulista, concomitantemente aguardando a adesão de tropas mineiras do Exército e da Força Pública Mineira (atual Polícia Militar do Estado de Minas Gerais) e, por fim, uma rápida marcha em direção à cidade do Rio de Janeiro, até então capital do país, para a deposição de Getúlio Vargas. Logo, as tropas paulistas demoraram em rumar em direção ao Rio de Janeiro na expectativa da adesão dos mineiros e de outros Estados. Porém, as tropas mineiras aderiram as forças federais e logo partiram para a ofensiva contra as tropas paulistas, que foram obrigados a defender seu próprio território das tropas federais, improvisando uma linha defensiva de trincheiras nas fronteiras dos Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro.

No início do conflito os paulistas chegaram a invadir a cidade mineira de Passa-Quatro, posteriormente tomada por tropas mineiras do Exército leais a Getúlio Vargas com o recuo dos paulistas e estes então acabaram por tomar posições fixadas na divisa entre os Estados de Minas Gerais e São Paulo, no alto da Serra da Mantiqueira, num lugar conhecido com Garganta do Embaú, bem como o Túnel da Mantiqueira da estrada férrea da então Rede Mineira de Viação. Nesses locais foram onde ocorreram os combates mais violentos e entre aqueles com o maior número de mortos do conflito, dado ser ponto estratégico.

Pelo fato de o Vale do Paraíba ser uma região repleta de serras e com terreno muito acidentado os combates foram encarniçados entre as tropas, porém com o tempo prevaleceu a superioridade das forças federais em número de tropas, munições e armamentos de artilharia, o que obrigava no continuo recuo das tropas constitucionalista para retificar as persistentes infiltrações na sua linha defensiva. Com isso as forças federais foram gradativamente ocupando diversas cidades paulistas do Vale do Paraíba como Queluz, São José do Barreiro, Areias, Silveiras, Cachoeira Paulista, Cruzeiro, Piquete e Lorena.
Soldado paulista da Cavalaria.
Créditos: Wikipédia.

O comandante do setor, bem como o general Bertoldo Klinger, comandante supremo do Exército Constitucionalista, além de outros comandantes do levante, foram em muito influenciados pela doutrina militar alemã. Assim, boa parte das estratégias empregadas naquela frente de combate basearam-se naquela doutrina, com destaque para a defesa em profundidade. Esta foi esclarecida pelo chefe do Estado Maior do Setor sul, o então capitão Joaquim J. A. Bastos, a qual consistia em camadas de linhas de defesa distribuídas entre postos avançados e trincheiras mais bem guarnecidas na retaguarda, de modo a poupar recursos e retardar o máximo possível o avanço das tropas adversárias, impedir o envolvimento e corte da retaguarda, além de minimizar as baixas. Com esse sistema, sempre que uma camada de defesa se tornava insustentável, recuava-se para trincheiras mais a retaguarda já preparadas ou por concluir pelas unidades de engenharia, construindo-se novas trincheiras mais atrás e assim sucessivamente. Com o emprego desse plano, o desgaste das tropas federais foi significativo a despeito de sua superioridade em homens e em recursos bélicos, as quais tomavam as linhas de defesa ao custo de muito atrito de combate, em baixas ou dispêndio de recursos. Logo, mesmo após a tomada das posições, as tropas federais precisavam recuar para se recomporem ou serem substituídas pelas tropas reservas, levando dias para articularem uma nova ofensiva, o que fazia as tropas paulistas ganharem tempo para também recomporem a sua defesa.

Em setembro de 1932, a linha defensiva das tropas constitucionalistas situava-se em Guaratinguetá, onde faziam frente a ofensiva das tropas federais posicionadas em Lorena. As trincheiras dos paulistas localizavam-se no atual bairro Engenheiro Neiva, nos arredores da Estação Ferroviária Engenheiro Neiva e alinhadas sentido noroeste-sudeste. Trata-se do local da "Última Trincheira" a que Guilherme de Almeida fez referência em seu famoso poema "Oração ante a última trincheira". O poeta e imortal da Acadêmia Brasileira de Letras foi combatente nesse setor durante aquele conflito e escreveu o poema quando da retirada geral das tropas paulistas dessa localidade. Consta também que o município de Guaratinguetá foi muito visado pela artilharia e pelos aviões "vermelhinhos" das tropas federais.

Setor Leste.

Uma das principais frentes de combate, situada na divisa entre São Paulo e Minas Gerais. Logo no início do conflito, os primeiros batalhões paulistas que seguiram para o então denominado "Setor Leste" ou a "Frente Leste", e esses tiveram seu "Batismo de Fogo" já na primeira semana de guerra. O "Batalhão Fernão Dias" ou também "Batalhão Paes Leme" era formado por voluntários, sendo uma de suas companhias comandadas pelo tenente Fernão Salles. Essa juntamente com outras companhias tomaram algumas cidades mineiras, como Jacutinga e Ouro Fino, sob ordens do capitão Antônio Pietscher. As tropas federais, antecipando um ataque paulista, haviam cortado as linhas da estrada de ferro e destruíram os pontilhões, a fim de evitar avanço das forças paulistas. Estas, por sua vez, fazendo reconhecimento do terreno e repondo os trilhos foram avançando na tentativa de tomar Pouso Alegre. Porém, em 20 de julho, à tarde, os paulistas foram repelidos pela fuzilaria e artilharia da tropas federais vindas daquela cidade, na altura de Borda da Mata, e terminou com o recuo dos paulistas para Eleutério e resultando na morte de dezenas de soldados. Os paulistas reagiram e improvisaram a sua defesa, em um combate que durou até a manha de 21 de julho. Neste combate, Fernão Salles, comandante daquela companhia, foi morto.

Nesse setor, também atuou a famosa "Coluna Romão Gomes" que chegou a integrar cerca de mil e quinhentos combatentes, entre voluntários e soldados da Força Pública de São Paulo, comandados pelo então capitão da Força Pública Romão Gomes. Consta que a "Coluna Romão Gomes" jamais perdeu uma batalha durante toda a sua campanha militar. A atuação dessa força se deu na região de São João da Boa Vista e São José do Rio Parto.

No centro-oeste do estado de São Paulo, próximo àquele front, destaca-se também a região de Botucatu, onde inclusive a Igreja Católica participou ativamente das atividades revolucionárias, que iam desde a coleta de fundos na campanha "Ouro para o bem de São Paulo", até o envio de enfermeiras e paramédicos para as frentes de batalha. O Bispo de Botucatu, Dom Carlos Duarte Costa, doou parte do tesouro da Diocese de Botucatu, chegando mesmo a doar sua "Cruz Peitoral", e organizou um batalhão que ficou conhecido como o "Batalhão do Bispo".

Ao final de setembro de 1932, próximo ao armistício, as cidades paulistas próximas à divisa com Minas Gerais já estavam ocupadas pelas tropas leais a Getúlio Vargas e as tropas constitucionalistas tinham a sua linha defensiva nos arredores da cidade de Campinas.

Setor Sul

O Setor sul de combate, situado na divisa com o estado do Paraná, no início da campanha militar era comandado por Pedro de Morais Pinto, um tenente-coronel da Força Pública de São Paulo. Esse front era considerado um dos principais teatros das operações de ambas as tropas adversárias. Porém, no início do conflito, foi o setor menos guarnecido pelo Exército Constitucionalista, dado a crença do apoio que viria do Rio Grande do Sul.

Entre 15 a 18 de julho, tropas paulistas estavam estacionadas em Itararé, cidade próxima a divisa entre São Paulo e Paraná. No entanto, o comando daquelas tropas deixou mal guarnecida a região norte daquela frente de combate, um local conhecido como "Passo do Cypriano". As tropas também estavam sem suprimentos e apoio logístico, que na ocasião ainda estavam por ser organizadas pelo comando. Mas, logo na segunda semana do conflito, foram de súbito atacadas por tropas federais comandadas por Valdomiro Lima, além das forças públicas estaduais vindas da região sul do país, as quais, após um breve confronto direto, manobraram pela região norte de Itararé, adentrando no território paulista justamente pelo "Passo do Cypriano", ameaçando cortar a retaguarda das tropas Constitucionalistas. Essa situação resultou na queda de Itararé em 18 de julho e, em 2 de agosto, do subsetor de Ribeira, o que obrigou as tropas paulistas a recuarem do largo da fronteira com o Paraná para cidades mais ao interior como Buri, Guapiara e Taquari. Após a queda de Itararé, Bertoldo Klinger, comandante supremo do Exército Constitucionalista, nomeou o então coronel Brasílio Taborda para assumir o comando geral das tropas da frente sul de combate. O cel. Azarias Silva, comandante da resistência na região de Ribeira, assim descreveu as razões da queda de Itararé:
“As tropas estacionadas em Itararé por um equivoco imperdoável, deixaram de guarnecer o Passo do Cypriano, situado ao norte, a 12 kilometros a nordeste de Itararé, por onde em 1930 entraram as tropas gauchas, e que era lógico que as que em 1932 vinham contra São Paulo fizessem a mesma coisa. Os inimigos, depois de atravessarem o Passo do Cypriano, rumaram para Ibity, com o fito de cortar a retaguarda do destacamento Moraes Pinto. Por felicidade surgiu o Coronel Klingelhoeffer que, com a sua visão perfeita da situação, determinou a retirada das referidas tropas para Ibity e dahi para Faxina, salvando dessa forma todo o destacamento, composto de 1700 homens. Critica-se a retirada de Itararé sem a destruição da linha ferrea. Mas o que se podia fazer a tropa que guarnecia aquelle sector si não possuia nem um cartucho de dynamite e nem mesmo uma picareta ou marreta? — Correio Paulistano, 18 de setembro de 1935”
Sob o comando de Taborda, as tropas paulistas ainda no mês de julho conseguiram organizar às pressas a sua linha de resistência na cidade de Buri, contando ainda com a ajuda do Trem Blindado nº 1, que contribuiu para conter o avanço das tropas federais, pois estas já adentravam pela cidade de Buri, entre 26 e 27 de julho. Como nas demais frentes, as tropas federais, em maior número e mais bem equipadas, ocuparam paulatinamente as cidades de Buri e Guapiara, ameaçando avanço sobre a capital paulista. Segundo o então capitão Joaquim J. A. Bastos, chefe do E. M do cel. Taborda, as forças federais comandadas por Valdomiro Lima totalizavam naquela frente cerca de 15 mil homens contra um efetivo de 5 mil soldados do Exército Constitucionalista que chegou a guarnecer mais de 600 km de extensão na fase final do conflito.

Matracas utilizadas pelas tropas constitucionalistas nos combates.
 Créditos: Wikipédia.
O Setor sul era organizado em destacamentos respectivos a três subsetores: na região de Ourinhos, Presidente Prudente e Itaporanga onde as tropas eram comandadas pelo cel. Pedro Dias de Campos; os destacamentos posicionados na região de Buri, Capão Bonito e do alto do Paranapanema comandados pelo cel. Christiano Klingelhoeffer; e, mais ao sul, na região de Guapiara e Xiririca (atual Eldorado), com tropas comandadas pelo Tte-cel. Pedro de Morais Pinto.

O cel. Taborda, a partir do momento em que assumiu o comando da frente sul, adotou uma estratégia eminentemente defensiva, baseada na doutrina militar alemã, buscando ali tão somente a contenção das tropas federais de modo a poupar recursos e também garantir que as tropas paulistas das demais frentes tivessem a possibilidade de assumir a ofensiva rumo a capital federal do país para, enfim, cumprir o objetivo do levante, que consistia na deposição do governo provisório e convocação de uma Assembleia Constituinte. Até o fim do conflito, em 2 de outubro de 1932, Taborda obteve relativo sucesso nesse objetivo, uma vez que as tropas comandadas por Valdomiro Lima da última semana de julho até a data da rendição oficial dos paulistas (num total de 70 dias) conseguiram avançar apenas 20 km além da cidade de Buri e, na ocasião das negociações do armistício entre as tropas adversárias, no início do mês de outubro, ainda continuavam contidas na altura do Rio Paranapanema, com as trincheiras paulistas posicionadas na margem leste.

Sul de Mato Grosso (atual Mato Grosso do Sul)

O então estado do Mato Grosso foi o único aliado de São Paulo no conflito. Após a deflagração do levante, a região sul do estado, atualmente contemplada pelo Mato Grosso do Sul, se emancipou ao declarar a sua autonomia e apoiar o levante. O novo estado passou a ser denominado como estado de Maracaju, cuja capital era Campo Grande e tendo Vespasiano Barbosa Martins a cargo da chefia do governo estadual.

Até o início de julho, o general Bertoldo Klinger comandava a circunscrição militar de Mato Grosso e, durante as preparações para o levante, prometia levar 5 mil soldados e copiosa munição daquele estado para engrossar as fileiras da tropas paulistas. Contudo, com a sua súbita exoneração ocorrida alguns dias antes do levante, o general perdeu aquele comando, o que comprometeu a obtenção total da adesão daquelas unidades, em especial, aquelas situadas em Cuiabá, que estavam alheias a situação e acabaram por permanecerem leais ao governo federal na ocasião da deflagração do conflito.

O setor respectivo ao estado de Maracaju foi comandado desde o mês de julho pelo coronel Jaguaribe de Mattos, que a princípio de setembro veio a ser substituído pelo coronel Nicolau Horta Barbosa. Sob esse comando, as tropas constitucionalistas daquela frente desbarataram uma coluna de soldados federais em Santana do Paranaíba, na região leste do estado, e também outra vinda de Goiás, com vários elementos tendo sido presos. Aquelas forças também repeliram forças federais em Três Lagoas e Porto XV de Novembro. Ao norte, em Coxim, também repeliram uma coluna vinda de Cuiabá que visava a tomada de Campo Grande. A oeste, aquelas tropas tomaram Porto Murtinho, Porto Esperança (Corumbá) e mais ao sul Bela Vista. As batalhas pela tomada de Porto Murtinho e Porto Esperança foram os feitos mais notáveis daquelas tropas no conflito, as quais conseguiram liberar acesso ao Oceano Atlântico e a fronteira brasileira com a Bolívia e o Paraguai para a entrada de recursos bélicos em favor das tropas de São Paulo, uma vez que o Porto de Santos estava sob bloqueio da esquadra naval governista.

Em meados de setembro, aquelas forças adquiriram completamente o controle da região em favor dos paulistas. Nas últimas semanas do conflito, aquelas forças ainda viriam dar reforço na frente sul paulista, com o Batalhão Visconde de Taunay junto com uma unidade de artilharia se deslocando para Capão Bonito para combater tropas gaúchas. Graças às forças constitucionalistas de Maracaju, os rebeldes tiveram o controle daquele estado, deixando livre o acesso das tropas paulistas àquela região, inclusive ao Rio Paraná e Paraguai. Por esse acesso, os paulistas conseguiram realizar o translado dos novos aviões adquiridos no estrangeiro. A atuação das tropas de Maracaju foi mais tarde reconhecida como notável pelos comandantes paulistas.

Até a data de rendição, o território do estado de Maracaju permaneceu com livre-trânsito para os paulista, tendo inclusive boa parte dos líderes do levante fugido do cerco governista via Campo Grande. Apesar da derrota militar dos rebeldes, em 1º de janeiro de 1979 a divisão regional ocorrida em 1932 foi consumada com a criação dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, uma divisão desejada desde o término da Guerra do Paraguai.

Rio Grande do Sul

Embora o general Flores da Cunha, então interventor do Rio Grande do Sul, tenha sido aliado de Getúlio Vargas naquele conflito, um grupo de gaúchos entraram na luta contra o regime provisório de Vargas. Esse grupo era liderado por Borges de Medeiros e consistia em um batalhão de cerca 450 homens. Embora fosse uma força diminuta e incapaz de neutralizar as tropas leais a Vargas, elas utilizavam táticas de guerrilha no esforço de distrair as tropas federais gaúchas de modo a impedir que fossem enviados destacamentos para reforçar as tropas federais que combatiam contra São Paulo.

Contudo, a frente rio-grandense da Revolução Constitucionalista chegou ao fim na Batalha de Cerro Alegre, no município de Piratini, no dia 20 de setembro de 1932, quando foram mortos mais de duzentos homens das forças rebeldes, sendo Borges de Medeiros preso em seguida. A derrota dos rebeldes no Rio Grande do Sul, ao final daquele mês, somada as dificuldades das tropas da resistência em São Paulo com a falta de recursos bélicos, foram algumas dentre as razões para o comandante supremo do Exército Constitucionalista solicitar o armistício em 28 de setembro e iniciar as tratativas para a rendição perante as forças governistas.

Litoral Paulista.

No início do conflito, o Exército Constitucionalista compôs um perímetro de defesa do Porto de Santos por meio de Minas Submarinas e de guarnições de artilharia e infantaria situadas no Forte de Itapu e em outros pontos estratégicos na região de Santos, de modo a impossibilitar a aproximação da esquadra da Marinha Brasileira ou um assalto de seus fuzileiros navais, na época comandada pelo Ministro da Marinha Protógenes Guimarães. Porém, essa esquadra cercou o litoral paulista impossibilitando o envio de recursos e suprimentos às tropas paulistas bem como a população, o que comprometeu seriamente a capacidade bélica bem como o comércio paulista. As minas submarinas foram projetadas e produzidas por engenheiros e técnicos ligados a Escola Politécnica de São Paulo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário